Entrevista | Marcelo Esquilo

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Treinador de atletas atuando como chefe da equipe brasileira no Mundial da ISA, Marcelo Esquilo troca uma ideia com nosso editor onde aborda temas ligados à preparação física, motivação e a experiência de comandar a seleção brasileira em dois Mundiais e um Pan-Americano

Marcelo Esquilo divide seu tempo entre as atividades de treinador e sua base de va’a “Esquilo Sports”. Foto: Arquivo pessoal

Atletas de alto nível como Caio Vaz e Babi Brazil, entre outros, estão entre os nomes de destaque que recebem treinamento de Marcelo Esquilo.
O carioca que possui doutorado em Ciências do Esporte e do Exercício Físico, também é conhecido por sua base de Va’a, “Esquilo Sports”, no Posto 6 de Copacabana, no Rio de Janeiro, e por sua atuação muito elogiada como técnico da seleção brasileira em Mundiais da ISA e Pan-Americano.

Qual a sua formação profissional e acadêmica?

Licenciatura plena e mestrado em Educação Física e possuo doutorado em Ciências do Esporte e do Exercício Físico.

Sou técnico em triathlon pela CBtri, Head Coach da Esquilo Sports e docente da Universidade do Estado do Rio de Janeiro – UERJ.

Também atuo como treinador particular de alguns atletas de elite do Brasil e do exterior.

Em sua opinião, quais são as qualidades mais importantes para quem pretende desempenhar o papel de técnico?

Primeiramente é preciso entender que o sucesso com o atleta com quem se pretende trabalhar dependerá de uma atuação múltipla, extrapolando a objetividade do cargo, pois as questões subjetivas, aquelas que não estão nos livros de fisiologia e treinamento desportivo, é que farão a diferença na preparação do atleta.

Imagine a disposição psicológica de um indivíduo chegando para treinar com o aluguel atrasado e a mãe doente?

Dizer para ele que aqueles tiros do treino intervalado farão o corpo dele mais capaz não é suficiente. Ele tem que entender que é através da dureza daquela sessão de treinamento que ele pode chegar ao lugar mais alto do pódio e isso aumentará significativamente as chances dele de resolver questões econômicas e auxiliar a sua mãe.

Alteridade significa se colocar no lugar do outro, e assim você tem mais chances de captar os anseios, limitações e potencialidades desse atleta.

Se me perguntassem isso há 15 anos, possivelmente eu falaria majoritariamente sobre aspectos técnicos da profissão. Hoje penso que a competência é cacife básico para entrar no jogo, agora, para jogar duro, o técnico tem que se envolver, se doar, ser aquela bateria extra que funciona quando tudo para e faz sujeito ir um pouco mais além nos treinos e consequentemente nas competições.

Marcelo Esquilo vibra junto com Caio Vaz após vitória em bateria do Mundial da ISA, que marcou o retorno do atleta às competições: “O técnico tem que se envolver, se doar”. Foto: ISA / Reed

Existe algum segredo para manter a motivação de um atleta em alta?

Costumo dizer em cursos e palestras que tenho oportunidade de estar, que a preparação física e treinamento técnico perfeito será sempre aquele em que o atleta sinta vontade de fazer e faz de tudo para cumpri-lo.

Se o sujeito treina mais, ele tem mais chance de vencer, portanto, o treinador que consegue fazer com que o atleta treine muito, tem uma competência nesse sentido, que deve ser valorizada, pois pode ser o que irá fazer a diferença em uma trajetória atlética campeã.

Por isso lhe digo que um ambiente de treino agradável, quando estamos em equipe, ajuda demais na motivação do atleta e amplia o desejo dele de voltar no dia seguinte.

Com os atletas que trabalho individualmente, diria que se ele sabe que tem um parceiro em cada sessão de treino, mesmo à distância, isso ajuda no comprometimento dele. Como faço isso? Falando com ele o máximo possível, estando conectado com seus avanços e suas dificuldades. 

Em quanto tempo você acredita que uma pessoa comum está apta a se tornar um competidor? (levando-se em conta que ela fez um check-up e está bem de saúde)

Tem muitas variáveis no meio do caminho, idade, passado esportivo, limitações fisiológicas etc. Porém, vale lembrar que um competidor às vezes fisiologicamente está pronto, mas do ponto de vista psicológico, não.

A periodização clássica gira em torno de 16 semanas para levar um atleta ao seu estado ótimo de condição física, porém, sob o aspecto psicológico, alguns nunca chegarão nesse estado.

Marcelo (à esq.) junto à quipe de Masters de sua base “Esquilo Sports” durante etapa do circuito fluminense de va’a. Foto: Arquivo pessoal

Você teve uma atuação muito elogiada no papel de chefe de equipe durante os Mundiais da ISA em 2017 e 2918 e no Pan-Americano de 2017. O que essa experiência representou pra você?

Foi uma experiência muito rica ter a oportunidade de trabalhar com os melhores do meu país em uma modalidade esportiva na qual tanto me envolvi.

Fui para Dinamarca em 2017 e sabia que teria por perto dois grandes atletas que tive a oportunidade de treinar no Brasil, o Caio Vaz e a Babi Brazil, porém voltei de lá conectado com todo o time e hoje os tenho como pessoas queridas que muito admiro.

O Mundial da China, no final do ano passado, teve um elemento que tornou o grupo muito conectado, que foi a limitação da comunicação. Quase ninguém em Hainan falava Inglês e por isso o grupo quando estava longe das delegações só podia conversar entre si, isso somado ao fato da distância do Brasil, deixou o grupo muito unido, uma família. 

Sobre o vice-campeonato Pan-Americano que a equipe brasileira conquistou em 2017, no Peru, diria que foi um momento mágico que vivi no esporte, não pelo título em si, mas pela união que aconteceu entre os atletas de surf e de SUP, e o carinho com que os latino americanos se tratavam.

Fico emocionado de lembrar das reuniões de avaliação e planejamento, onde atletas veteranos e novatos se abraçavam de uma maneira fraterna como poucas vezes eu vi na minha trajetória esportiva seja como atleta ou treinador.

A parceria com o João Renato, que foi o preparador físico do time, e o Carlos Bahia na parte técnica, no Peru, em 2017, foram fundamentais. E também contar com apoio e experiência de Bezinho Otero, na Dinamarca, fizeram muita diferença.

Equipe que representou o Brasil no Mundial da China. Foto: Arquivo pessoal

No Mundial da ISA, principalmente, devido à falta de apoio, nossa equipe sempre teve que trabalhar na base do improviso. Como fica o papel do chefe de equipe numa situação dessas?

Estava com atletas em seu apogeu de treinamento, portanto, ali o que restava era atender às demandas que considerei preponderantes: assumir o papel burocrático (agenda, reuniões técnicas, protestos etc.) e cobrir os atletas com o máximo de atenção que uma pessoa sozinha fosse capaz de dar.

Espero ter conseguido, pelo menos um pouco, tê-los atendido. Todos merecem demais chegar aonde chegaram. Atletas de altíssimo nível com uma logística amadora. Aplaudo de pé!

Em sua opinião, qual seria uma saída para chegarmos mais fortes ao Mundial?

Acho que a CBSUP e os atletas, bravamente, chegaram ao limite que a carência de recursos permite fazer.

Nossos atletas estão entre os melhores do mundo. No Mundial somos tratados com a mesma expectativa que os jogadores da seleção brasileira de futebol são.

Disse para a equipe, em uma das nossas reuniões, após o ouro do Luiz Diniz na Dinamarca, que havíamos despertado o respeito e admiração em todos naquele evento, e acho que é isso que as seleções estrangeiras sentem em relação aos atletas de Stand Up Paddle brasileiros de Wave, Race, Técnico e Sprint, eles sentem respeito e admiração.

Quero aproveitar essa oportunidade para agradecer à CBSUP, na figura de seu presidente, Ivan Floater, pela confiança no meu trabalho e pela oportunidade oferecida nos Mundiais e no Pan-Americano.

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