Remando pela mística Islândia
Com paisagens únicas e ricamente preservadas, a Islândia é uma grata surpresa para qualquer remador com ... leia mais
Uma viagem começa muito antes de sua partida. Quatro amigos, quatro pranchas de stand up e o mínimo de bagagem à bordo. Com uma programação de apenas dois meses, nosso grupo realizou uma longa travessia saindo de Paranaguá (PR) e chegando a Iguape (SP) sem apoio de embarcação.
O destino, Iguape, era objetivo do grupo e o desafio seria realizar essa remada sem apoio. Idealizei essa expedição durante uma minhas remadas solo pelo litoral do Paraná até Guaraqueçaba. Restava agora compor o grupo.
Desde o ano passado, quando participei de uma remada de 138 km, de Paranaguá até Cananéia, sabíamos que era possível fazer sem apoio, pois o trecho, mesmo distante, permite pernoitar em alguns lugares estratégicos, remando por entre canais e até chegar à baia de Paranaguá, mais extensa, formando um acesso entre os estados de PR e SP, ainda muito preservada e cercada pelo o que restou da floresta atlântica nativa em nosso litoral.
Formamos o grupo eu, Leo Pielak, juntamente com Jessé Pedro, Leandro Teodoro e Joca Dias.
No dia da partida, 26 de setembro, as condições meteorológicas não estavam boas, mas decidimos mesmo assim encarar a primeira etapa saindo de Paranaguá às 7h da manhã. Chuva, frio e vento eram constantes e, ainda, a falta de visibilidade logo nos primeiros 5 km de percurso elevou o risco, pois reduzia a referência da costa.
Felizmente, estávamos bem familiarizados tanto com a região, quanto com nossos aparelhos de navegação. O porto pouco aparecia; a Ilha do mel muito menos!
Remando sob uma forte neblina e chuva fina, fomos direto para ilha de Piaçaguera para pegar a costa como referência. O peso da bagagem nas pranchas dificultava a estabilidade, porém, foi uma questão de tempo até cada um se adaptar ao peso extra e aproveitar o vento que felizmente começou a soprar de forma favorável e virou uma ajuda constante, que nos levou por um downwind por mais de 20km de surfe pela baia de Paranaguá.
Fizemos uma parada programada na Ilha da Banana para um breve café. Foi também o momento para arrumar as bagagens nas pranchas. Ficamos de olho no cronômetro para não perdemos o fluxo da maré favorável, que nos levaria muito distante até a próxima parada, para o almoço.
Alcançando o quilômetro 30, fizemos então outra breve parada para o almoço na ilha de Guapecum, ainda no litoral paranaense. Fomos recebidos pelo Sr. Rubens, local da Ilha, em seu estabelecimento, onde eu e Jessé preparamos uma lasanha.
Agora em águas abrigadas, as condições meteorológicas passaram a ter pouca influência e chegava a hora de aproveitar as águas calmas e a maré favorável até alcançar a próxima parada programada.
Tínhamos a alternativa de tentar alcançar o estado de são Paulo já no primeiro dia, porém, em uma puxada maior. Por outro lado, tínhamos a possibilidade de pernoitar em Vila Fátima (PR), cuja localização nos deixaria bem próximos do Canal do Viradouro, na divisa entre Paraná e São Paulo. Ficamos com essa opção.
No caminho, mais uma breve parada na Ilha de Tibicanga, onde nos reidratamos assistindo a um grupo de botos e guarás dando um show bem à nossa frente. O sol finalmente começou a a aparecer e seguimos remando até a Vila Fátima, onde fomos muito bem recebidos pela família do Cristiano e Dona Tereza. Lá, saboreamos um jantar mais que necessário e muito receptivo, com peixe da região e então o descanso necessário para alcançamos o km 50 programado para o dia 02.
No dia 27, às 6h da manhã, após um belo café em Vila Fátima, nos despedimos da família que nos recebeu e partimos em direção a São Paulo. Mais alguns quilômetros e entraríamos no Canal do Varadouro que divide os dois estados. Aberto em 1950 pelo homem na forma mais rústica, o canal ajudou a formar o Parque Nacional de Superagui e era a principal via econômica na época.
É notável a variação da vegetação quando entramos no canal. A natureza e a ambição do homem em um mesmo local; o silêncio e a paz. Cruzávamos o estado.
Após 5 km de travessia pelo canal, o sol já brilhava forte e os ventos intensos nos levaram até a próxima parada, Ariri, já em São Paulo, serpenteando pelos calmos rios da região, onde avistamos alguns turistas.
Fizemos uma breve parada para hidratação e compras de remos artesanais decorados com pássaros da região.
Com o vento agora soprando contra, seguimos até a cidade fantasma de Ararapira. De um lado São Paulo, do outro Paraná. Hoje, com apenas uma igreja resistindo ao tempo e algumas ruínas do séc. XVIII, a outrora cidade vai aos poucos sendo dragada pelas águas. Consequência da abertura do canal artificial. A essa altura, já havíamos passado dos 73km.
Seguimos para Ilha do Cardoso, que estava logo à frente. A forte maré e o vento dificultavam a travessia até a comunidade, então costeamos.
Remando pela costa nessa região, é comum encontrar um artefato de pesca denominado “cerco”, usado para captura da tainha. Por incidente o atleta Jesse Pedro teve o seu leash preso nesse artefato e seu SUP foi arrastado pelo vento, mas resgatado com segurança.
Paramos por alguns minutos em Marujá, Ilha do Cardoso, mas como estávamos com um atraso de uma hora e meia, logo deixamos a ilha, pois tínhamos 35 km pela frente até Cananéia.
Teríamos que chegar lá com a luz do dia, pois seria necessário atravessar toda a baia de Cananéia. Novamente o vento forte nos fez aproveitar o downwind por todo o trajeto chegamos às 17h15 a ilha da Casca; às 18h00 chegávamos à ponta de Cananéia, já abrigados, na costa.
Porém, a mare contra nos atrasou até a chegada à comunidade, fato que nos levou a remar os últimos quilômetros do dia já de noite, porém, contemplado uma linda revoada de guarás, destacando sua forte cor vermelha no horizonte ao cair do dia.
Pernoitamos em Cananéia batendo os 120 km programados. Transitamos com os pelas ruas da cidade até chegarmos à pousada. Muita gente vinha perguntar de onde estávamos vindo. Fomos atendidos pelo Rafael em seu restaurante muito bem decorado. Jantamos à beira mar.
Esperando pela maré mais favorável, saímos de Cananéia às 11h do dia 28. O vento leste forte persistia e tínhamos pela frente apenas 30 km. Optamos então por fazer um percurso até Balneário Pedrinhas, em Ilha Comprida, que tem esse nome por conta de sua extensão 70 km de praia por um lado e, pelo outro, um longo canal por onde enfrentamos horas de vento contra, que nos obrigava a remar colados à margem.
Chegamos em um pequeno vilarejo chamado Juruvauva onde fomos recebidos pelo proprietário de um estabelecimento a beira mar, onde almoçamos. Continuamos a remada às 17h e deseguindo em direção a Balneário Pedrinhas, que seria nossa última parada.
Remamos à noite, mas a forte corrente favorável nos motivou a seguir em frente. Este, que era o percurso final, sofre influência das duas barras. A mesma maré que é vazante no meio do canal, vira enchente na boca da barra.
Ao chegarmos em Balneário Pedrinhas nos foi oferecida uma casa pelo local Sr.Wilson e fomos recepcionados no píer central pelo Diretor de planejamento urbano da Prefeitura de Ilha Comprida, Sr. Pérsio, que nos disse que pretende fomentar os esportes náuticos na região promovendo eventos desse tipo.
Domingo, dia 29, às 06h30 da manhã com dia de sol partimos para nossa última pernada: 50 quilômetros finais contra a maré.
Inicialmente fomos trocando de margem pois a correnteza era constante. Um duro percurso serpenteando o Rio Ribeira. Nas margens, porém, havia muitos “cercos”. Percebemos que o artefato usado para a pesca da tainha, acaba sendo nocivo para outras, pois encontramos uma tartaruga morta no interior de um deles.
Apesar de estarmos mais próximos da cidade, a natureza ainda se mantinha muito presente, Avistamos alguns jacarés nas margens e muitas aves com diferentes colorações, vários Biguás e botos nos acompanhando em alguns momentos.
Com a água barrenta predominando alcançamos o marco denominado “encontro das águas”, demarcado com uma baliza e logo à frente o cemitério dos índios, com uma igreja muito bem conservada, é ponto de visitação para quem faz esse trajeto.
A vegetação que o rio arrastava já dava a entender que Iguape se aproximava, mas a força da corrente nos deixava quase parados e, ainda somada ao vento contrário, tornava a remada muito desgastante.
Portanto, fazer constantes paradas se tornou necessário. Resolvemos comer algo rápido hidratar ao longo dessas paradas e não almoçar para tentar terminar o quanto antes os últimos quilômetros.
O vento nos arrastava para cima da vegetação, na margem direita, nos obrigando a trocar de lado e aproveitar o vento. Aos poucos o grupo foi se dispersando e cada um aplicando sua melhor estratégia para contornar a corrente ideal e entrar no percurso final, já na região de Iguape.
Por volta das 15h30 entramos no rio que banha a cidade, na direção da Basílica de Bom Jesus de Iguape, muito reverenciada por seus devotos, encerramos com sucesso nossa Sup Travessia.
Acompanhamos a missa onde fomos recebidos pelo padre local e contamos um pouco da nossa viagem.
Retornamos de carro com Duda Goterra para nossa cidade.
Leandro Teodoro, com apenas três meses de stand up paddle, era um dos mais animados do grupo por ter concluindo o percurso de 200 Km:
“Tive o prazer em fazer essa viagem remando. Todos os anos meus familiares fazem de barco agora foi minha vez!”, disse.
Agradecemos a Deus por ter nos conduzido nessa longa travessia, a todas as famílias que nos receberam ao longo do trajeto, ao sr. Rubens local de Guapecum, Dona Tereza e Cristiano Vila Fatima, Rafael Espetinho Beira Mar, em Cananéia, sr Wilson, Bal. Pedrinhas, sr. Persio, Diretor de Planejamento de Ilha Comprida, e toda a receptividade do Padre Fridianuss Ati da basílica Senhor Bom Jesus de Iguape.
Aos apoiadores nossos agradecimentos ao Lavonza e Adriano Dutra proprietários da Wood Cuuter Brasil Curitiba, ao Luiz Felipe e Adriano Ratzek representantes da Califórnia Republic de Curitiba, ao Dario Ghandour, proprietário da Star Fish International Uruguai, Luciano Meneghello, editor-chefe do alohaspiritclub.com.br e ao Anderson Peixe @peixenewsoficial.
Parte do grupo Paraná Sup Adventure segue agora para sua próxima sup travessia em Minas Gerais, de 150 km nos cânions de Capitólio.
Total percorrido: 202,14 km
Tempo: 31h 33′ 59″