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A canoísta Fernanda Rachid comanda o “Remando Juntos”, um projeto de inclusão esportiva, focado em crianças no espectro autista. O objetivo é oportunizar autonomia, auto estima, saúde e alegria para crianças e suas famílias. “A ideia é deixar o desenvolvimento acontecer no ritmo e tempo de cada um. Não se tem pressa para chegar à algum lugar específico” explica Fernanda.
O projeto é um sonho antigo da atleta, que também é pedagoga, educadora física e, desde 2016, representa Brasília nos campeonatos nacionais e o Brasil nos campeonatos internacionais de Canoagem de Velocidade e Canoagem Oceânica na categoria máster.
A inspiração para o “Remando Juntos” veio das vivências dentro e fora da água. Do esporte combinado com sua formação acadêmica. Há 20 anos, ela atua na área da educação, com ênfase em projetos socioambientais, formação de professores e educação inclusiva.
“Durante esse período tive algumas oportunidades de trabalhar com crianças no espectro autista em diferentes esferas, mais especialmente em escolas. Apesar da formação pedagógica na área do ensino especial abranger a questão do desenvolvimento humano, a minha formação acadêmica na área da saúde em educação física é recente e, de fato, vem contribuindo bastante para ampliar ainda mais o olhar sobre o indivíduo enquanto ser integral e também social” conta a canoísta.
No segundo semestre de 2019, Fernanda realizou um projeto piloto com três famílias convidadas. “Esse trabalho foi importante para perceber se de fato minhas hipóteses estavam corretas e também o desenvolvimento de metodologias adequadas para o público alvo, crianças e adolescentes e suas respectivas famílias”.
Com um início de ano atípico por conta da pandemia, além de algumas mudanças de local de realização do projeto, as atividades puderam ser retomadas somente em agosto, já com as adaptações necessárias para cumprir os protocolos sanitários. “O trabalho, aos poucos, está sendo reformulado e retomado. Ainda preciso de apoio, de recursos materiais e humanos para desenvolvê-lo e ampliá-lo” explica a coordenadora.
A definição do autismo é o transtorno de desenvolvimento grave que prejudica a capacidade de se comunicar e interagir e pode afetar o sistema nervoso. “O alcance e a gravidade dos sintomas podem variar amplamente. Os mais comuns incluem dificuldade de comunicação, dificuldade com interações sociais, interesses obsessivos e comportamentos repetitivos” explica Rafaelly Carvalho da Silva Molina, pedagoga e especialista no espectro autista.
Ela pontua que o reconhecimento precoce, assim como as terapias comportamentais, educacionais e familiares podem reduzir os sintomas, além de oferecer um pilar de apoio ao desenvolvimento à aprendizagem.
Fernanda, que também é especialista em ensino especial, destaca as variações apresentadas em cada diagnóstico. “Precisamos lembrar que há o transtorno do espectro do autismo, o que significa que ele abrange muitas características e varia de indivíduo para indivíduo. Para mim, é um jeito peculiar de ser e estar no mundo”.
Ambas as especialistas pontuam uma particularidade do espectro autista: a interrelação da criança com seus semelhantes, ou seja, para além de qualquer comorbidade associada, é necessária empatia para entender um comportamento que difere da maioria.
“Há um grande desgaste resultante de tentar modelar uma criança atípica dentro de um modelo típico. No cotidiano, quando somos sabedores de um diagnóstico, precisamos expressar que somos solícitos, colaborativos e contextualizar nossos pares (nossos filhos, por exemplo) de que aquela criança precisa de um outro carinho e um outro contato” explica Rafaelly.
Oferecer oportunidades de socialização para o autista é fundamental para o seu desenvolvimento integral, tanto do ponto de vista emocional, social quanto físico e cognitivo. “Quanto mais diversificado os espaços de convivência, maior será o campo da expressão de potencialidades do indivíduo. No entanto, é preciso respeitar o espaço e tempo de cada um sem criar expectativas ou gerar uma tensão desnecessária para o sujeito, o que nesse caso, pode gerar efeitos negativos como alguns traumas, tanto para as famílias como para os sujeitos” pontua Fernanda.
Apesar do foco do projeto estar na criança ou adolescente com necessidade especial, ele também vai além e abrange as pessoas mais próximas desse indivíduo, ou seja, sua família.
“Juntos, por meio da confiança e da afetividade trabalhamos muito mais do que os aspectos cognitivos, sensório motor, mas também a autonomia e o estreitamento dos laços fraternos”, foi o que sentiu a Valdene Vieira de Souza, mãe da Lara Cicilia Vieira Trajano, de 12 anos, que aprendeu a remar no “Remando Juntos”.
“Os ganhos foram muitos. A Lara era muito agitada e tinha muita resistência à comandos. Como ela não fala, tudo fica um mais difícil. É um ganho que faz muita diferença no dia-a-dia dela e no nosso também” conta a mãe.
Valdene completa: “Gostaria de agradecer a Fernanda por todo carinho com a minha filha. Ela trabalha com muita dedicação, carinho e a paciência, sem receber nada em troca. Ficamos muito felizes por tudo que ela representa no desenvolvimento da Lara”.
Fernanda conheceu o esporte em 2009, quando foi convidada a elaborar um programa de fomento à qualidade de vida e bem-estar dos servidores da Universidade de Brasília, tendo a prática da canoagem e a educação ambiental como elementos norteadores. Surgiu então o projeto “Caiaque Comunitário”, da qual foi coautora.
“O programa rapidamente ganhou muita visibilidade e a demanda aumentou, assim como nossas ações, passando a abranger toda a comunidade universitária e também a população do Distrito Federal, com diversas ações” explica. Durante o mesmo período, auxiliou no retorno do Clube Universitário de Canoagem (CUCA), focado em estimular o alto rendimento entre os alunos.
“A água sempre esteve presente na minha atuação profissional, seja ela como elemento simbólico ou propulsora de ações e intervenções transformadoras. Água combina com movimento, estar em movimento, conhecer o seu próprio corpo. Tudo isso é fundamental para o desenvolvimento cognitivo, emocional e funcional. Nesse sentido, busco unir o trabalho corporal, a água, o meio ambiente, o contato com a natureza para então trabalhar o desenvolvimento integral do ser humano” define Fernanda.
Fonte: CBCa