Roberta Borsari explora Timor-Leste e Timor Ocidental de stand up paddle
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Em 2015, ao receber o título de doutor honoris causa em Comunicação e Cultura, na Universidade de Turim, na Itália, o escritor Umberto Eco, em seu discurso, foi taxativo ao descrever o que na sua opinião seria o papel negativo das redes sociais na disseminação de informações.
Para o pensador italiano, antes das redes sociais existirem, os ‘idiotas da aldeia’ tinham direito à palavra “em um bar e depois de uma taça de vinho, sem prejudicar a coletividade”, e agora, com a internet, a opinião de uma pessoa menos esclarecida tinha o mesmo peso do que a de um Prêmio Nobel.
À época, Eco foi também criticado por sua declaração, pois, na opinião de alguns críticos, ele não estaria respeitando o direito democrático ao livre exercício de opinar, criticar e denunciar.
Mas o fato é que, divergências à parte, todos concordaram em um ponto:
“liberdade de expressão e responsabilidade argumentativa precisam andar juntas.”
O SUP BRASILEIRO E O MILAGRE DO CRESCIMENTO ECONÔMICO
Trazendo esses fatos para a realidade do stand up paddle brasileiro, que viveu um boom de crescimento raramente visto em uma modalidade esportiva, praticamente da noite para o dia esse esporte ganhou milhares de adeptos e ídolos foram revelados prematuramente.
Já em seu primeiro ano de existência, o Circuito Brasileiro de SUP realizou provas com premiação em dinheiro permitindo o estabelecimento da categoria profissional, enquanto outras modalidades, como o surfe, por exemplo, levaram anos para viabilizar um circuito composto por provas com premiação em dinheiro.
Isso foi bom por um lado, mas, por outro, criou uma falsa ideia de que “a coisa estava pronta”, quando, na verdade, estávamos todos aprendendo.
No epicentro desta situação a Confederação Brasileira de SUP (CBSUP) navegou por águas calmas enquanto a economia do país bombava e a febre do SUP atraia investimentos por todos os lados.
Obviamente, como nos ensina a natureza e, também, as leis da economia, somos movidos por ciclos e a fase de ascensão do stand up paddle deu lugar a um período de estabilização. Em outras palavras, o esporte parou de crescer. Só que esse novo ciclo culminou justamente com a pior crise econômica da história do Brasil.
Aos poucos as premiações foram diminuindo, as estruturas minguando e os eventos mais restritos. E foi ai que as criticas começaram ganhar mais vulto nas redes sociais.
Atletas de peso passaram a usar seus perfis para reclamar dos mais variados temas, desde erros cometidos por supostas falhas organizacionais, passando pela diminuição nas premiações e o cancelamento de provas.
Em alguns casos, as críticas, quase sempre direcionadas à CBSUP, beiravam a alucinação, como no caso de um atleta que fez um post criticando a “milionária taxa de chancela cobrada pela confederação para a validação de uma etapa do brasileiro”, quando, na verdade esses valores, entre outras informações que envolvem a realização de um Brasileiro, podem ser encontrados no livro de regras disponível no site da confederação.
Um jornalista tem a obrigação de checar os fatos antes de emitir uma publicação, mas quem escreve na internet, não.
Os anos de 2016 e 2017 foram complicados para a CBSUP. Poucos elogios e muitas críticas. Algumas com fundamentos, mas outras movidas por pura ignorância e maldade.
O DESPERTAR DO CAPS
Faço a cobertura do circuito brasileiro desde a sua criação e foram inúmeras às vezes em que reuniões solicitadas por atletas foram atendidas. Sou testemunha de que a entidade sempre ouviu os atletas (o que não significa que as queixas foram atendidas, mas o diálogo sempre houve).
Ainda assim, as criticas seguiram sendo feitas nas redes sociais. E o quê de produtivo elas trouxeram para o stand up paddle? Na prática, nada!
Até que, por conta da necessidade que os atletas convocados para representar o Brasil no Mundial da ISA em 2017, foi criado um grupo de whatsapp para, em principio, facilitar a comunicação entre eles em assuntos referentes à organização e preparação para a competição.
A ideia partiu de Américo Pinheiro, que percebeu que essa seria uma forma eficaz para que os atletas se organizassem e alinhassem suas demandas para serem direcionadas à CBSUP e CBS de forma mais eficaz e uniforme.
“Eu tive a ideia de criar o CAPS para criar uma voz ativa dos atletas nas conversas com as confederações e contribuir com propostas sobre a organização das seletivas. Foram convidados os dez primeiros atletas do ranking nacional, masculino e feminino, para fazer parte do grupo. Eu, por não ser mais ranqueado, deixei claro a todos que se quisessem, eu sairia do grupo, mas até o momento todos concordaram com a minha permanência”, contou Américo.
A ideia do “CAPS”, que significa “Clube dos Atletas Profissionais de SUP”, e nada mais é do que um grupo de whatsapp, funcionou muito bem no desenrolar do Mundial da ISA, principalmente para lidar com assuntos mais polêmicos.
“Percebemos que tirando a polêmica do Facebook, onde muita gente que não tem conhecimento dos bastidores emite opiniões sem fundamento e que acabam por desviar o foco do real problema, através do CAPS conseguíamos nos entender e alinhar o discurso antes de acionar a CBSUP”, ponderou Américo, que cita como exemplo a recente polêmica sobre a proximidade de datas entre a primeira e a segunda etapa do Brasileiro de SUP, que acontecerão no mês de junho em finais de semana seguidos.
“Conversamos bastante sobre a proximidade das datas e das consequências que isso poderia gerar, porém, chegamos a um consenso de que tendo em vista a dificuldade que organizadores estão enfrentando para confirmar eventos oficiais, era muito importante apoiar a realização de ambos”, concluiu.
O PORTA VOZ
O grupo decidiu que caberia a Arthur Santacreu o papel de divulgar nas redes sociais as decisões do CAPS e desde seu primeiro post ficou claro que a postura adotada pelos atletas da elite agora seria muito mais construtivista do que critica.
Pedi ao Arthur para explicar o papel do grupo e ele me deu a seguinte declaração:
“O CAPS, antes de mais nada, surgiu com a ideia de discutir e repassar os assuntos referentes ao mundial da ISA entre os atletas profissionais! Sendo assim, os integrantes ficaram restritos àqueles atletas que estavam na disputa pelas vagas.
Foi feita uma reunião onde conversamos todos diretamente com o Ivan, presidente da CBSUP, mostrando o nosso interesse em não mais “criticar” a confederação, como até então sempre foi feito, mas sim “colaborar” com a entidade, de forma a trabalharmos juntos para a evolução do esporte.
Nesta reunião fui escolhido como o representante, ou seja, aquele que faria o intermédio entre CBSUP e CAPS. Mesmo assim alguns de nós estabelecemos contato direto com a CBSUP de forma individual e saudável, pois nosso intuito jamais foi restringir esta comunicação, mas sim facilitar a transmissão de ideias de forma clara, e não apenas como opiniões pouco fundamentadas.
Com os atletas mais unidos e esclarecidos a respeito das decisões da CBSUP o grupo passou naturalmente a discutir outros assuntos referentes ao nosso esporte”, revelou.
NÃO EXISTE MONOPÓLIO
Tuca também falou comigo sobre a ideia equivocada de que o CAPS seria uma forma criada pelos atletas profissionais para ter acesso privilegiado a informações.
Esse pensamento é facilmente refutado quando tomamos conhecimento de que comumente foram realizadas reuniões abertas entre atletas ranqueados e a diretoria da CBSUP em etapas do Brasileiro, e que sempre foi pedido pelo próprio Ivan Floater para que os atletas criassem grupos de whatsapp para discutirem de forma organizada em sem interferências externas os rumos que gostariam que o esporte tomasse.
Mas isso nunca aconteceu, até a criação do CAPS.
“A CBSUP sempre nos estimulou e pediu para que os atletas elegessem seus representantes, porém até então ninguém o fez!
Portanto, tomamos uma iniciativa não para monopolizar ou nos aproveitarmos de privilégios, mas sim para ser seguida de forma organizada!
Sabemos por experiência que discussões abertas não funcionam, portanto, incentivamos a criação de grupos organizados com representantes aptos a discutir e levar os pontos de vista do seu grupo. Dessa forma podemos ter ambientes mais adequados para nossas discussões.
Nós do CAPS, entramos em consenso a respeito de manifestações em mídias sociais, de forma a nos afastarmos, pois em nossa humilde opinião e experiência, isto apenas denigre a imagem do nosso esporte.
Somos apenas um grupo, como tantos outros que podem vir a surgir, que decidiu parar de criticar a nossa confederação e resolveu ajudá-la para o crescimento do SUP!”, finalizou o atleta que foi medalhista de bronze no Mundial da ISA.
A criação do CAPS é, portanto, apenas o que esperamos que seja o início de uma nova postura entre os atletas e amantes do stand up paddle.
Como bem disse Santacreu, é importante que outros grupos sejam criados para discutir e, principalmente, amadurecer ideias em pequenos círculos, para que então elas sejam apresentadas a um maior número de pessoas e à própria CBSUP com maior poder de fundamentação. Afinal, como ensinou Humberto Eco “liberdade de expressão e responsabilidade argumentativa precisam andar juntas”.