
Canoas V6 ‘invadem’ Niterói com a 2ª etapa da Copa Brasil de Va’a
Niterói foi palco da Segunda Etapa da Copa Brasil de Va’a. Evento contou com participação de equipes ... leia mais
No universo Va’a existe uma pergunta que todo mundo pensa, mas quase ninguém tem coragem de jogar na roda: afinal, quem paga a conta?
Porque, vamos combinar: remar é lindo, é poético, tem aquela vibe espiritual de conexão com a natureza. Mas junto vem a parte nada zen: boletos, inscrições de competições, manutenção de canoa, aluguel de guarderia, mensalidade de clube, instrutores particulares, associações, federações e custos absurdos para organizar uma competição minimamente decente.
E já aviso: não é o mar que banca isso tudo. O mar não é sócio do clube, não viabiliza competições, não dá desconto de fidelidade. O mar, no máximo, manda a fatura em forma de onda atravessada, correnteza contra ou huli inesperado. Ele só cobra — e cobra caro, com juros.
Quando falamos em “quem paga a conta”, não é só sobre dinheiro. É sobre quem sustenta o esporte de verdade, quem veste a camisa, quem mantém os clubes vivos, quem viabiliza competições e festivais. Porque sem essa galera, o Va’a seria apenas meia dúzia de canoas largadas na areia e alguns remadores jurando ser campeões mundiais… bêbados no churrasco de domingo.
De um lado, temos o remador leal, que veste a camisa do seu clube como se fosse armadura. Ele não tá atrás só de medalha de latão: o que busca é propósito, suor e desafio. É o cara que paga a mensalidade do clube antecipada e ainda agradece a cobrança.
Compra o melhor remo, o colete top, participa de todas as travessias, aparece em cada clínica técnica e ainda banca do próprio bolso sua inscrição da competição, hospedagem, transporte e o que mais pintar. O que ele ganha? Muitas vezes chegar em último. Mas tá feliz, porque o verdadeiro prêmio é desafiar seus limites.
Esse é o remador que permanece anos no mesmo clube, evolui lentamente, mas nunca desiste. Resiliente, assiste de camarote à frustração de quem abandona o esporte na primeira derrota. Ele não pergunta “quanto custa?”, mas sim “quando é a próxima?”. Ele sustenta o esporte, movimenta o mercado e ainda aplaude quem chegou depois. Não é cliente: é pilar. Sem ele, não existe Va’a.
No mesmo clube, aparece aquele remador “super atleta” de ego inflado. O sujeito que acha que rema tanto que o simples fato de aparecer já deveria contar como pagamento.
Esse quase nunca paga mensalidade. “Pra quê?”, ele pensa. Treina cada dia numa equipe e em clubes diferentes, e quando chega a competição, é o primeiro a soltar: “quem vai bancar minha inscrição?”, “a organização vai oferecer algum benefício?”. Porque, na cabeça dele, é bom demais pra gastar do próprio bolso.
É o que pede desconto em tudo, mas na hora de competir aparece como se fosse patrocinado pela Red Bull: Track&Field da moda, colete Vogah, reminho Viper brilhando e, claro, chegando de carrão — ou até com uma canoa de carbono milionária.
É também o remador que veste camisa de clube como se fosse abadá de carnaval: usa, exibe e troca por uma nova de outro clube na próxima competição. Se depender dele, a Va’a vira circo: ele no picadeiro e os clubes e organizadores de competição de palhaço.
Aí, no meio desse caldeirão louco, nasce o remador pão duro. O cara que acha que GymPass e TotalPass são a chave do sucesso — não pela qualidade técnica do clube, não pela experiência dos instrutores, mas porque “é mais barato, né?”. O sujeito não percebe que esses sistemas pagam pros clubes quase ⅓ de uma mensalidade em média. É tipo pedir picanha pagando preço de salsicha.
E quando a aula lota? Ele fica indignado, sem entender como funciona o milagre da multiplicação dos bancos das canoas. Quer exclusividade pagando mixaria. Explicar pra ele que o clube não é ONG? Esquece.
E, quase no rodapé deste cardápio de personagens, surge o remador que ficou desempregado. Esse é traiçoeiro: se pintar uma indenização na conta, em pouco tempo vira “concorrente”, montando clube próprio com a fórmula mágica do “Ctrl+C + Ctrl+V”. É a franquia pirata da Va’a: hoje tá na sua canoa, amanhã inaugura a dele do outro lado da praia, com logo feita no Canva e plano “promocional” para iludir seus alunos.
Já o remador de fé é outro capítulo. Esse não tem grana nem pra balaio de açaí, mas aparece em todas. Merecia incentivo, apoio, políticas de acesso… mas o que recebe? Tapinha nas costas e muito “boa sorte aí”.
Rema com o colete que sobrou no canto do clube, pega remo emprestado que parece ter remado na ocupação da polinésia de mil anos atrás, e ainda assim dá seus pulos pra competir. Chega com nada, entrega tudo.
E o mais irônico? São justamente esses que mais surpreendem na água — e, claro, os que o meio da Va’a insiste em valorizar menos.
Enquanto uns pagam a conta com suor, dinheiro e lealdade, outros se acomodam em cima de status, favor e ego barato. Sem o remador leal, o esporte não anda. São eles que mantêm os clubes vivos, que dão fôlego às competições e que transformam a Va’a em uma verdadeira Ohana.
No fim das contas, existem muitos perfis, mas só um sustenta o remo na água. E é esse que, de fato, escreve a história da Va’a.
Já o restante só existe porque alguém banca a farra. Se o esporte dependesse apenas deles, a Va’a seria como espuma de onda: impressiona por instantes, mas desaparece sem deixar rastro.
E é aí que fica a pergunta, incômoda e sem escapatória: você é quem banca ou quem é bancado?