Superação e belezas naturais na 2ª edição do Desafio das Ilhas
Realizada no último sábado (24) segunda edição do Desafio das Ilhas teve como tônica o forte calor e a ... leia mais
844 pessoas participaram de nosso estudo sobre percepção de segurança na va’a. A enquete, que ficou aberta por 15 dias, recebeu respostas de remadores de todo Brasil, de ambos os sexos, idades e experiência distintas.
As repostas, como veremos abaixo, são um espelho do atual panorama da percepção de segurança da va’a no Brasil e servirão de parâmetro para que clubes, associações, federações e a confederação brasileira, guiem seus esforços em ações mitigatórias.
Cada uma das respostas abaixo receberá uma análise do Sargento do Corpo de Bombeiros Militar de Santa Catarina e remador, Noé Medeiros Batista, mas podemos adiantar que alguns pontos chamaram a atenção.
De uma maneira geral, as respostas mostram um bom nível de conscientização entre os remadores, principalmente entre aqueles que tem até três anos de experiência, responsáveis por pouco mais de 50% das respostas foram dadas.
Rio de Janeiro (323), São Paulo (122) e Espírito Santo (112) lideram o número de participações e uma menção especial deve ser feita ao Pará, um estado onde a chegada da va’a é mais recente, em que as 47 respostas mostram que os paraenses estão interessados no tema. Já a baixa adesão em regiões onde o esporte é bem mais difundido, e com federações estaduais estabelecidas, como é o caso de Ceará e Brasília (DF), indicam uma provável necessidade de maior ênfase na promoção de campanhas de conscientização sobre segurança na água.
Das 844 respostas, 453 (53,7%) foram respondidas por mulheres, enquanto 391 homens (46,6%) responderam ao questionário.
Abaixo, entraremos nas questões abordadas no questionário seguidas pelos comentários e análises de Noé Medeiros Batista:
“Muito bom saber que mais de 90% das respostas dessas pessoas que praticam esporte na água sabem nadar. Porém, esse número deveria ser 100%. Isso significa que temos 6,5% de pessoas que estão se arriscando.
Mesmo usando o colete salva-vidas, alguém que não sabe nadar pode se afogar dependendo da situação em que vai parar na água. Por exemplo, se canoa tombar (uli) e essa pessoa for lançada de cabeça para baixo, engolir muita água e entrar pânico.
Então, fica a sugestão para chegarmos aos 100% de praticantes sabendo nadar e usufruindo com segurança dos benefícios do ambiente aquático”.
“De acordo com as respostas, concluímos que bem poucas pessoas tem a própria canoa em relação ao número de praticantes. Em outra resposta (mais abaixo) a maioria declarou que rema de OC6 (canoa para seis remadores). Então, posso deduzir que a maioria também rema de colete. Mas seria interessante fazer uma nova pesquisa, entre aqueles que remam de canoa individual se também usam colete”. (NOTA: lançaremos essa pesquisa nos próximos dias)
“Acompanhando a lógica da resposta anterior, em que a maioria declarou não ter canoa própria, são poucos os que têm mais do que cinco anos de prática em canoas individuais”. De acordo com as respostas, concluímos, portanto, que poucas pessoas tem a própria canoa em relação ao número de praticantes”.
“Muito bom saber que mais de 50% das pessoas remam acompanhadas. Isso já é um fator tranquilizante, porém, me preocupa os 23 remadores (2,7%) que responderam que sempre remam sozinhos e também os 17,8% que normalmente remam sozinhos (150 remadores).
Minha orientação a eles é que usem sempre um colete salva-vidas, leash, algum sistema de GPS a bordo, avisem alguém sobre sua ida ao mar e que procurem remar próximo à costa, para minimizar riscos”.
A maioria rema em grupo e isso inclui os que remam tanto de canoa individual, quanto coletiva. Na resposta anterior, vimos que 52,7% daqueles que remam em canoas individuais, jamais remam sozinhos. Pela análise do questionário, me parece que há um nível de conscientização maior na remada coletiva que consequentemente impacta positivamente o remador que opta por sair de canoa individual. (NOTA: Essa pergunta permitia mais de uma resposta)
“Agora entramos em questões bem específicas quanto à segurança e considero preocupante que apenas 51,5% das pessoas tenham respondido que verificam mapas de previsão antes de ir para água. Mesmo se a ideia é fazer uma remada curta, perto da costa, é fundamental olhar a previsão antes de sair, a saber: tempo, ventos e swell.
E mesmo a melhor das previsões não é 100% precisa. Tive uma experiência de uma travessia que fiz e planejei o horário de saída e chegada baseado na previsão, que apontava a entrada de um forte vento sul mais para o final do dia. Porém, a intensidade do vento começou a aumentar antes do previsto, mas, justamente por ter estudado a previsão antes, mudei rapidamente a minha rota e me aproximei mais da costa, pois sabia que um forte vento de quadrante sul estava se aproximando, e isso fez toda a diferença”.
“É muito importante saber ler a previsão de swell. Existem situações em que o vento está em uma direção, mas o swell em outra, então é importante esse conhecimento, pois o swell também interfere na corrente e mesmo em distâncias pequenas pode colocar o remador desavisado em uma situação de alto risco, tendo que lidar com ondas e correntes com as quais não esperava encontrar.
42% responderam que não sabem ler um mapa de previsão de swell. Entendo que parte dessas respostas têm influência daqueles que remam em água doce, ou seja, ambientes sem influência de ondulações, porém, se essas pessoas pretendem remar em algum momento no mar, é fundamental saber ler esses mapas”.
“Vemos uma ligeira melhora no conhecimento dos remadores que sabem ler os mapas de previsão de ventos, mas a proporção não muda muito em relação ao caso acima. Somente 29,6% (250 praticantes) responderam que sabem ler completamente as previsões de ventos. Temos que chegar aos 100%!”
“Vemos aqui uma sensível melhora no quadro. Mas acho que todo mundo consegue ver as informações básicas de previsão do tempo, ou seja, se vai chover ou não ou a temperatura. Aqui eu acredito que é mais uma questão de se criar o hábito de sempre olhar a previsão, verificar se vai fazer calor ou frio, a que horas pode chover, pois são fatores que incidem diretamente na remada.
Pode ser também que muitas dessas pessoas que não têm o hábito de olhar os mapas de previsão remem em canoas coletivas e estejam confiando no responsável pelo treino. Não aconselho agir assim. A segurança na água deve ser responsabilidade de todos e parte desse processo é saber como estarão as condições de tempo, vento e swell antes de sair.
Deixo a sugestão para que se invista mais em cursos e palestras sobre a análise desses mapas de previsão, algo que considero fundamental para segurança aquática”.
“Isso é primordial. Às vezes remo sozinho, mas minha esposa sabe onde estou e o tempo aproximado da remada. Se eu demoro, ela já começa a ficar preocupada! É sempre bom ter alguém informado sobre a remada que você irá fazer e o tempo aproximado. Se levar o celular, compartilhe a localização em tempo real pelo whatsapp com essa pessoa”.
“Essa resposta deveria ser 100%, porque que os 9,7% (82 respostas) sequer usam colete ou leash, que é o mínimo. Tem que se usar sempre o leash, mas podemos considerar que o uso do colete só não é imprescindível na área de surfe, próximo da praia, mas, mesmo assim, no caso de um mal súbito, a chance de se afogar sem um colete é altíssima. Precisamos desmistificar essa questão.
“Veja que somente 66,9% dos que declararam sempre usar algum tipo de equipamento de proteção, usam com frequência. Quanto aos 33,1% que só recorrem ao uso de equipamentos de proteção quando as condições estão mais intensas, deduzo que se essas pessoas têm experiência, sabem ver as previsões, avisaram alguém sobre sua rota e não vão para longe da costa, ok, é aceitável e até importante que tenham essa consciência de que usar o equipamento de proteção no caso de um vento mais forte, uma remada mais pra fora, etc. Mas recomendo ao menos o uso de um leash e se a pessoa não é muito experiente, não tem nem o que questionar. Uso de equipamento de proteção é mandatório”.
“Leash e colete foram os mais assinalados e isso está de acordo com o que a gente espera minimamente do conceito de equipamento de segurança. Bacana que muita gente também assinalou o uso do apito, de um celular carregado e um GPS. Outros itens que foram pouco comentados, mas achei interessante foram: sair com um remo reserva; cabo reboque e canivete; água extra para se manter hidratado e roupas apropriadas com o tempo (bonés, blusas com proteção UV, vestimenta para o frio, etc.), pois isso também faz parte da segurança.”
“Esse é um ponto que merece atenção. 51,5% dos frequentadores de clubes de va’a não sabem se os proprietários têm algum tipo de certificação aquática e posso falar baseado em minha experiência que a maioria não tem! É uma questão sensível e nós da Life Saving Brasil temos um projeto para criar um curso básico de segurança aquática tornando mais acessível esse conteúdo justamente por que temos observado essa realidade. Mas que bom 39% respondeu que sim. Esperava uma porcentagem menor”.
“Essa resposta confirma que pouca gente tem alguma experiência. Recomendo fortemente a todos praticantes de esportes aquáticos que façam ao menos um curso básico de segurança aquática, pois esse conhecimento vai fazer a diferença em uma situação crítica. Só da pessoa estar calma e saber como se comportar, já ajuda muito. Em algumas regiões o Corpo de Bombeiros oferece esses cursos, mas existem também empresas privadas direcionadas para ministrar esse tipo de conhecimento. É super importante que um clube ou uma entidade ligada ao esporte ofereça esses cursos a seus alunos/ filiados, de tempos em tempos.”
“Das 844 pessoas que responderam ao questionário, somente 359 responderam aqui. Ou seja, menos da metade. Importante notar também que a maioria que buscou esse tipo de conhecimento, o fez por iniciativa própria. Precisamos fortalecer essa cultura. Vejo muito pouca ação nesse sentido por parte das entidades que regem o esporte, deixando essa responsabilidade com os clubes, o que não é bom. Precisa ser um esforço conjunto”.
“Buscar informação sobre segurança aquática é muito importante, mas faço uma ressalva que a internet é um lugar em que se vê de tudo. Então, procure sempre se informar através de sites confiáveis, como o Aloha Spirit Midia. Verifique quem são as pessoas que estão escrevendo essas matérias, que qualificação possuem, quais fontes foram usadas como referência, isso tudo tem que ser observado ao buscar informação na internet. Ainda assim, nenhum artigo ou matéria, por melhor que sejam, serão capazes de substituir um curso de segurança aquática.”
“Nos dois casos, em âmbito regional e nacional, notamos que as entidades realizam algum tipo de ação, mas precisam ser mais atuantes, pois essas respostas vão de encontro ao que escrevi mais acima. Veja que, entre os praticantes de va’a que fizeram algum tipo de curso sobre segurança aquática, só 5% (18 pessoas) responderam que fizeram através de alguma entidade. Essa é a prova de que as associações, federações e confederação brasileira devem dar mais atenção ao tema.”
De uma maneira geral, os praticantes de canoa polinésia têm consciência dos riscos envolvidos na prática da canoagem polinésia, mas há uma grande responsabilidade concentrada nos clubes de va’a, sobre os quais não há algum tipo de acompanhamento ou controle de qualificações dos responsáveis pela condução das canoas.
Recomendamos às associações, federações e confederação brasileira buscarem parcerias com órgãos públicos e empresas especializadas para oferecer cursos e treinamento na área de segurança, bem como na interpretação de mapas e previsão do tempo, swell e ventos.
Noé Medeiros Batista
Sargento do Corpo de Bombeiros Militar de Santa Catarina, guarda-vidas desde 2007, medalhista mundial de Salvamento Aquático Desportivo e pedagogo formado pela Universidade Federal de Santa Catarina – UFSC.
Luciano Meneghello
Jornalista e escritor, diretor de conteúdo do site Aloha Spirit Mídia, editor assistente dos sites Hardcore e Go Outside, autor do livro Raiz, uma viagem pelas origens do surfe, canoa polinésia, stand up paddle e prone paddleboard, granduando em Antropologia pela Universidade Federal de Santa Catarina – UFSC.