Curso Básico de Va’a | A posição do corpo durante a remada
No oitavo artigo da série Curso Básico de Va'a, iremos falar sobre a posição do corpo durante a remada em ... leia mais
“Fiel da balança” é uma expressão antiga, mas usada até hoje para descrever o poder que algo ou alguém tem para influenciar de forma decisiva o resultado de uma disputa.
Podemos afirmar sem sombra de dúvida que na canoagem polinésia brasileira o parava’a é nosso “fiel da balança” em competições internacionais.
De todos os campeonatos mundiais de va’a organizadas pela IVF que tiveram participação de brasileiros, nem sempre trouxemos medalha para casa. Porém, em todas as vezes que trouxemos, havia, no mínimo, uma medalha conquistada no parava’a.
Isso sem contar nas ocasiões em que todas as medalhas vieram através do Parava’a. Esse foi o caso, por exemplo do Mundial de Velocidade no Canadá, em 2012, quando paracanoístas do clube Rio Va’a conquistaram todas as seis medalhas brasileiras: 2 ouros e 4 pratas.
Mas o Canadá não foi um caso isolado. Em 2016, também em um Mundial de velocidade, dessa vez na Austrália, quando José Agmarino Coelho, o “Zecão” (In Memorian), conquistou a única medalha brasileira: bronze nos 250 m VL3.
Em 2018, o Brasil ficou na oitava colocação do Mundial de velocidade do Taiti graças aos dois bronzes conquistados por Guilherme Borrajo (novamente as únicas medalhas conquistadas pelo Brasil no evento).
Guilherme, que começou a remar na Rio Va’a inspirado pelo sucesso dos paracanoístas no Mundial de 2012 e hoje tem seu próprio clube, o Moai Va’a, especializou-se na Longa Distância e mostraria a que veio no ano seguinte, na Austrália, quando conquistou a única medalha de ouro do Brasil, competindo na V1 VL3.
“Na história do Brasil nos Mundiais, tanto Sprint como Longa Distância, são os Parava’as quem estão trazendo mais medalhas. É uma galera muito forte! Temos pelo menos 10 paraatletas de altíssimo nível. Eu diria que se a gente conseguisse montar uma V6 com os melhores os Parava’as do Brasil, a gente ia dar muito trabalho em qualquer categoria”, conta Guilherme Borrajo, classificado para representar o Brasil no Mundial de Longa Distância que será realizado em Samoa, em 2023.
Contudo, os bons resultados conquistados pelo parava’a brasileiro não se traduzem em incentivo à formação de paraatletas.
Ainda que existam clubes, empresas do segmento e organizadores de eventos conscientes em relação ao parava’a, de uma maneira geral, falta apoio. Há casos em que a modalidade parece ser incluída apenas de forma figurativa, como conta Andre Prates, medalha de ouro no Mundial de velocidade da Inglaterra deste ano (advinha? Única medalha de ouro do Brasil na competição):
“Já participei de competições sem a menor estrutura de acessibilidade. Não era possível nem mesmo subir no pódio, que foi montado sobre um palanque em que não havia rampa de acesso! O que esses organizadores não percebem é que acessibilidade vai além do parava’a. Tem a ver também com atletas da super máster”, pondera Andre.
No entanto, Prates conta que as dificuldades de um paraatleta da va’a brasileira vão muito além da falta de estrutura em algumas competições.
Sem se levar em consideração as óbvias dificuldades de mobilidade e locomoção, ainda existe o preconceito e a falta de apoio. Mesmo com tanto potencial e sucesso representando o Brasil em Mundiais, os pararemadores precisam ralar muito para conseguir competir e treinar.
“Hoje existem clubes que apoiam o parava’a e levam seus paraatletas nas competições nacionais, mas no caso de competições internacionais, cada atleta tem que correr atrás, pois os custos são muito altos”, conta Andre, que faz uma ressalva:
“Não só no parava’a, mas em todas as categorias da va’a, todos precisam correr atrás de patrocínio para representar o Brasil em provas internacionais, acontece que a maioria dos parava’a são pessoas de baixa renda, então, participar de um evento como o Mundial da Inglaterra, em que cada atleta gastou em média uns R$25 Mil com a viagem, fica muito difícil viabilizar a participação”.
Mesmo com vários títulos no currículo, tanto na paracanoagem, como no parava’a, Andre teve que se esforçar muito para conseguir viabilizar sua viagem, fazendo rifas e vaquinhas. Mesmo assim, chegou ao Mundial sem saber onde iria dormir, pois até chegar lá, não havia encontrado um lugar para se hospedar a preços compatíveis com sua verba de viagem e precisou recorrer a ajuda de outros atletas brasileiros.
Há, evidentemente, que se refletir sobre a responsabilidade da confederação brasileira nesse processo, no caso, a CBVA’A. No entanto, Andre reconhece que o esporte ainda é muito novo no Brasil e a confederação faz o que pode, com a estrutura que tem, dependente de trabalho voluntário.
Mas há um entendimento geral de que a captação de um patrocínio ou ajuda de custo tem maior possibilidade de êxito quando parte de um projeto criado por uma confederação. E aqui cabe uma reflexão sobre uma questão crucial levantada pelo próprio Andre:
“Realmente conseguir cobrir os custos de uma delegação inteira para um campeonato mundial é difícil, pois é uma despesa muito alta e, no final, cada atleta acaba encontrando seu jeito de bancar sua viagem, mas o que eu acho mais difícil é a fase de preparação de alto rendimento, que também demanda um custo alto com suplementação, treinamento, equipamentos, que muitas vezes passam despercebidos aos olhos do público e que no caso do parava’a são mais altos ainda”, revela.
Os números não mentem e os resultados falam por si. Mesmo com tanta dificuldade e falta de apoio, o parava’a brasileiro continua brilhando em competições internacionais. A questão é: será sempre assim?
É necessário, portanto, que entidades, empresários do setor e organizadores de eventos, de uma maneira geral, entendam que apoiar o parava’a nacional não é um “gesto de caridade”, mas um investimento inteligente.
Até agora, as inciativas mais significativas voltadas para o fomento do Parava’a brasileiro partiram de ações conjuntas dos próprios paraatletas, como foi o caso do Primeiro Encontro ParaVa’a, organizado por Guilherme Borrajo e Luciano Fachinni no Rio de Janeiro, em 2021.
O encontro mostrou que com um pouco mais de apoio, a modalidade ganhará ainda mais visibilidade, uma vez que Guilherme reconhece que já há o reconhecimento, mas que é preciso ir além:
“Acredito que já há um reconhecimento em relação ao potencial do parava’a no Brasil, mas acho que mais do que reconhecimento, precisamos de investimento e apoio de empresários e entidades para viabilizarmos nossas viagens e treinamentos”, conclui Guilherme Borrajo.