Curso Básico de VA’A | Uma breve história do va’a

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História do va'a
Através de uma parceria inédita e sem precedentes no Brasil, a plataforma Aloha Spirit Mídia disponibilizará o Curso Básico de Va’a criado pelo profissional da educação e capitão da base Tribuzana, André Leopoldino. Nesta semana, o primeiro capítulo. Foto: CC / Reprodução

Olá queridos leitores do Aloha Spirit Mídia, é um prazer imenso estar escrevendo esta série de artigos sobre canoa polinésia. Nosso objetivo aqui será o de trazer para todos vocês um material básico, mas bem completo, sobre o va’a.

Todo o material que você verá aqui foi desenvolvido por mim e disponibilizado no Curso Básico de Va’a, um material com mais de 100 páginas de apostilas oferecidas em 08 capítulos, com mais de 03 horas de videoaulas e diversos exercícios de avaliação. Mais informações sobre o curso você encontra aqui.

Para a plataforma do Aloha Spirit Mídia iremos trazer uma abordagem em formato de artigos, onde você poderá navegar pelo mundo do va’a realizando a leitura de novos assuntos a cada semana. Ao todo teremos 14 artigos, conforme descrito abaixo:

  • Artigo 01: Uma breve história do va’a
  • Artigo 02: A origem do va’a no Brasil
  • Artigo 03: Conhecendo as canoas polinésias
  • Artigo 04: Nomenclatura do va’a
  • Artigo 05: Anatomia das canoas polinésias
  • Artigo 06: Conceitos fundamentais da remada
  • Artigo 07: As fases da remada
  • Artigo 08: A posição do corpo durante a remada
  • Artigo 09: As funções de cada banco
  • Artigo 10: Remando com segurança
  • Artigo 11: Aplicativos e procedimentos para remar com segurança
  • Artigo 12: Aprendendo sobre Huli
  • Artigo 13: Os tipos de remo de Va’a
  • Artigo 14: Regras de competição

Viu quanto assunto interessante? Borá lá então…

ARTIGO 01: UMA BREVE HISTÓRIA DO VA’A

origem das rotas de colonização da Polinésia
Através de suas canoas, os polinésios foram protagonistas das rotas migratórias mais impressionantes da história da humanidade. Foto: Reprodução de quadro do pintor Herb Kawainui Kāne

Por André Leopoldino, capitão do Tribuzana Va’a e instrutor/desenvolvedor do Curso Básico de Va’a.

O primeiro artigo rumo a nossa jornada ao mundo do va’a começa em uma viagem pelo Oceano Pacífico, mais precisamente por toda a Polinésia. A Polinésia é formada por uma grande região marítima, formando um triângulo tendo como vértices o Havaí (Hawai’i) a norte, Nova Zelândia (Aotearoa) a oeste e Ilha de Páscoa (Rapa Nui) a leste do Oceano Pacífico.

Os polinésios são os habitantes originários desta região com mais de 3 mil anos de uma história repleta de acontecimentos marcantes. Segundo Bleiney, autor do livro “Uma Breve História do Mundo” as viagens dos polinésios tiveram início a partir do sudeste da China com uma lenta migração em direção a Taiwan. De Taiwan, uma série de viagens ao longo de séculos foram realizadas em sentido leste por toda a Polinésia em umas das viagens migratórias mais fascinantes da história do homem. Além disso, existem diversos outros estudos de povos vindos da Melanésia e de todos os lados da macro-arquipélogo da Austronésia.

Existe um documentário da National Geographic chamado “Polinesia (El Continente Perdido del Pacífico)” e nele é mencionado que em alguns artigos escritos por viajantes europeus do século 18, os polinésios eram descritos como “um povo selvagem que navegava em canoas primitivas, com os corpos tatuados e que guardavam os crânios dos adversários como troféu”. Existiam relatos de cerimônias religiosas com sacrifícios humanos realizados pelas tribos que habitavam essa região no passado, inclusive com rituais de canibalismo.

Estes mesmos artigos do século 18 levantavam dúvidas que este povo primitivo teria conseguido colonizar todas as ilhas do triângulo polinésio em canoas, navegando por milhares de quilômetros. No mesmo documentário da National Geographic, o professor de antropologia Barry V. Rolett defende que o povo polinésio possuía uma sociedade complexa, inteligente e organizada com uma grande ordem social composta por deuses, reis, sacerdotes, líderes espirituais (kahunas), guerreiros, agricultores e aldeões. O professor Rolett fala que o canibalismo não era visto como uma fonte de alimentação para o povo, mas sim uma grande cerimônia religiosa.

As cerimônias religiosas muitas vezes aconteciam após alguma batalha, onde o líder de uma tribo comia o coração do oponente derrotado com o objetivo de possuir seu “mana” e se tornar mais poderoso. O “mana” é visto pelo povo polinésio como um poder espiritual e pode estar presente em todas as formas da natureza, como por exemplo, em árvores, rochas e animais sagrados. É comum encontrar em diversas ilhas da Polinésia gravações rupestres em forma de desenhos de tartarugas e pássaros sagrados, como também outras formas geométricas. Além destas gravações, existem diversas esculturas em pedras chamadas de “Tiki”. Os Tikis representam deuses e o povo ancestral dos polinésios, protegendo as tribos de inimigos. Um dos maiores exemplos de Tiki são os moais encontrados na Ilha de Páscoa.

Em 1722, já em um passado não muito distante, em um Domingo de Páscoa, exploradores europeus chegam a uma ilha de formação vulcânica distante a mais de 3 mil quilômetros da costa do Chile. O comandante do navio batiza a descoberta de Ilha de Páscoa, mas muito antes dos europeus, entre os anos 400 e 800 depois de Cristo os polinésios já haviam ali chegado. Eles eram os Rapa Nui, nome original da ilha.

Ainda de acordo com o documentário da National Geographic “Polinesia (El Continente Perdido del Pacífico)” os moradores mais antigos contavam que os primeiros polinésios a chegar em Rapa Nui foram liderados por um rei chamado Hotu Matu’a, originários de um continente perdido chamado Hiva. A história conta que Hotu Matu’a após perder uma batalha em Hiva se viu obrigado a encontrar outra ilha para os sobreviventes de sua tribo, chegando então até Rapa Nui. Posteriormente, seria comprovado que o continente de Hiva seria então as Ilhas Marquesas, na Polinésia Francesa.

Mais tarde, através de estudos de análise de sangue dos antigos moradores da Ilha de Páscoa foi encontrado DNA com origem de outras regiões da Polinésia. E para ir além, foram encontrados DNA de origem de povos da América do Sul, podendo indicar que os polinésios chegaram a esse continente muito antes de Cristóvão Colombo. Mais um indício desta descoberta foi a batata-doce, que é encontrada em algumas ilhas da Polinésia, mas não é originária desta região, mas sim, da América do Sul conforme informações do documentário da National Geographic.

Ainda sobre este assunto, Luciano Meneghello autor do livro “Raiz” comenta que “…resultados de testes genéticos realizados em crânios de índios botocudos, que viveram no Brasil, por volta de 1800, em cujas cadeias de DNA foram encontrados traços concretos de ancestralidade polinésia…“.

Indo mais além, existem estudiosos que defendem uma versão que os deuses representados pelos tikis eram na verdade uma forma de vida inteligente e evoluída, originários de outros planetas ou de um plano espiritual mais evoluído, restando como forma de representação deste povo as grandes estátuas de deuses, os tikis.

Uma outra teoria sobre a Polinésia é abordada no livro “A Expedição Kon-Tiki” do norueguês Thor Heyerdahl. Em 1947, Thor realiza uma expedição partindo da América do Sul em direção a Polinésia a bordo do barco Kon-Tiki. Ele defendia que indígenas sul-americanos teriam descoberto a Polinésia, contrariando a versão da origem dos polinésios vindos do sudeste da China navegando em grandes canoas de casco duplo a vela.

Foi então, no início dos anos 70, que um movimento de recuperação da cultura havaiana surge pela iniciativa de Ben Finney, um antropólogo americano, o artista Herb Kawainui Kane e o velejador Tommy Holmes. Os três formaram a Polynesian Voyaging Society e constroem uma réplica de uma canoa polinésia seguindo as bases das técnicas de construção dos ancestrais polinésios. A canoa foi chamada de Hokule’a, nome dado em referência a uma estrela localizada na latitude do céu havaiano, que significa Estrela da Alegria.

História do va'a

Segundo Stuart Holmes Coleman conta em seu livro “Eddie Would Go: a história de Eddie Aikau, herói havaiano”, no dia 1º de maio de 1976 a canoa de 60 pés inicia sua jornada a caminho do Taiti. A tripulação completa sua viagem até o Taiti em 34 dias chegando no porto de Papeete, sendo recebida por quase 17 mil pessoas. Em seu retorno para o Havaí, uma nova tripulação completaria a viagem em apenas 22 dias. Mais tarde em uma outra viagem, Eddie Aikau daria sua vida em busca de ajuda ao naufrágio sofrido pela Hokule’a.

Através de dezenas de viagens pelo Pacífico e uma volta ao Mundo, a Hokule’a não apenas comprovou que os polinésios exploraram e colonizaram toda a Polinésia, como também eram profundo conhecedores da navegação usando somente o vento, ondas e estrelas. Assim dando uma visão contrária a teoria de Thor Heyerdahl contada no seu livro Kon-Tiki.

História do va'a

Nainoa Thompson fala no documentário da National Geographic Channel “Polinesia (El Continente Perdido del Pacífico)” que “…a Polinésia era vista por seu povo como um mundo marinho, sendo o mar que conectava a terra e não o que separava, sendo o oceano uma autopista navegada com grandes canoas de casco duplo e com grandes velas, chamadas de Canoa Polinésia…”. Desde 2017, Nainoa Thompson é o Presidente da Polynesian Voyaging Society e reconhecido como um mestre na técnica de navegação polinésia, discípulo de Mau Piailug, um navegador antigo da pequena ilha Satawal, na Micronésia. Mau Piailug era carinhosamente chamado de Papa Mau, e foi dele que a técnica da navegação orientada pelo sol, estrelas, ventos, nuvens e pássaros foi ensinada aos mestres de navegação da Hokule’a e todos os seus discípulos, como por exemplo Nainoa.

A Canoa Polinésia foi então o tipo de embarcação utilizada como forma de colonização das ilhas do triângulo polinésio há mais de 3 mil anos. Na época era comum o uso deste tipo de embarcação para diversos fins, onde para grandes travessias utilizavam-se grandes catamarãs munidos de grandes velas que permitiam a navegação em grandes distâncias, como por exemplo, a Hokule’a. Já para distâncias medianas o povo polinésio utilizava canoas menores de até seis remadores, como também elas eram utilizadas para transporte e pesca. As canoas individuais também eram utilizadas para diversos fins.

Para cada região do triângulo polinésio, os povos tinham um nome diferente para a canoa polinésia. No Havaí elas eram chamadas de Wa’a pelo povo nativo, mas posteriormente os americanos começaram a chamar o Wa’a de Outrigger Canoe, por isso a utilização da sigla OC6 para identificar a canoa Wa’a de seis remadores, por exemplo. Já no Taiti as canoas são chamadas de Va’a até os momentos atuais e na Nova Zelândia elas são chamadas de Waka Ama. Em um próximo artigo e no capítulo 2 do Curso Básico de Va’a, mais detalhes sobre as canoas polinésias e os significados dos nomes em cada região são apresentados.

A quantidade de informação disponível em livros, documentários, canais do youtube e outras fontes é interessante para você buscar mais detalhes sobre o povo polinésio. Conhecer essa cultura irá ajudar no entendimento das atividades compreendidas pela canoa polinésia e irá enriquecer seus estudos. No próximo artigo você irá conhecer como a canoa polinésia chegou ao Brasil.

Um big aloha e até breve!

Atenção: Conteúdo protegido por direitos autorais. Proibida a reprodução parcial ou integral sem prévia autorização de André Leopolino / Aloha Spirit Midia (LEI Nº 9.610, DE 19 DE FEVEREIRO DE 1998).

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:

BLAINEY, Geoffrey. Uma Breve História do Mundo. São Paulo, SP: Editora Fundamento Educacional, 2009.

MENEGHELLO, Luciano. Raiz, Uma viagem pelas origens do surf, canoa polinésia, stand up paddle e prone paddleboard. Florianópolis, SC: Editora Ypêamarelo, 2020.

COLEMAN, Stuart Holmes. Eddie Would Go: a história de Eddie Aikau, herói havaiano. São Paulo, SP: Editora Gaia Ltda, 2004.

HEYERDAHL, Thor. A Expedição Kon-Tiki: 8000km numa jangada através do pacífico. 11ª ed. – Rio de Janeiro: José Olympio, 2013.

SITES CONSULTADOS:

hokulea.com

archive.hokulea.com

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