Pedrinho Weichert completa a primeira travessia de va’a solo da história em Fernando de Noronha
Desafio foi concluído na última quarta-feira (04) em 3h38. Pedrinho Weichert foi a primeira pessoa a ... leia mais
Rio de Janeiro, 24 de abril de 2021
Em vista das reportagens que foram publicadas nos últimos dias pelo Aloha Spirit Midia e pela Paddle News, além de postagens em redes sociais, gostaria de esclarecer os eventos que de fato ocorreram ontem, dia 22/04, na entrada da Baía de Guanabara.
Inicialmente, é importante destacar desde logo que eu e os remadores que estavam no local temos experiência em variadas condições de mar e climáticas em geral.
Pessoalmente, minha experiência com esportes náuticos ultrapassa 28 anos, quando comecei a surfar de body board, velejar e a praticar caça submarina. Na adolescência migrei para o surf, onde também adquiri experiência em variadas condições de mar. Por conta de uma lesão no ombro tive que parar de surfar no final da adolescência.
Remo de va’a desde 2014. Há alguns anos treino de forma intensiva, sob orientação de um preparador físico com cerca de 30 anos de experiência específica para esportes a remo. Nossos treinos são feitos no mar, de 4 a 5 vezes por semana, além de treinamento funcional, natação ou boxe nos dias intermediários.
Remo em variadas condições de ondulação, correntes e vento, em canoas individuais (oc1 e v1) e coletivas (v3, oc 4 e oc6, nas quais também sou leme há cerca de 6 anos).
Também em minha prática do va’a, sempre que possível surfo de oc1 ou v1, seja em downwinds ou próximo à costa – em locais como Itapuca, Morcego (ambos em Niterói), Posto 6 em Copacabana, dentre outros, a depender das condições e direção das ondulações.
Especificamente sobre o swell dessa semana, eacu e um grupo de remadores experiente da minha base acompanhamos atentamente seu início e remamos nos dois primeiros dias, em condições de downwind. Ontem, faríamos mais uma remada, como planejado.
Também sabíamos que, conforme a previsão, era provável que a chamada “Besta” fosse quebrar na entrada da Baía da Guanabara, especialmente pelo fato de que a ondulação iria rondar de sul para sudeste, com sensível diminuição do vento sudoeste que vinha prevalecendo nos dias anteriores.
Como já fiz algumas vezes em anos anteriores, quando vimos que a Besta iria “funcionar”, decidimos ir assistir ao fenômeno. Quem conhece o local, sabe que há uma “zona de segurança”, localizada no canal entre o Forte Laje e o costão, que por ter maior profundidade não costuma quebrar ondas, permitindo remar na região com considerável segurança.
Saímos com equipamento de segurança (auxiliar de flutuação inflável, leash, telefone celular e até máscara, caso precisássemos desembarcar em algum local não previsto). Também avisamos aos remadores mais experientes de nossa base nosso horário de saída, local de destino e horário estimado de retorno. O localizador por GPS do meu celular também estava ativado (Life 360). Entendo que esses procedimentos são básicos para todo remador de va’a, em qualquer condição marítima.
Chegando ao local, vimos que haviam outros remadores conhecidos, além de diversos surfistas, 3 ou 4 jetskis de apoio para tow in e mais algumas lanchas com surfistas e cinegrafistas, todos posicionados na zona de segurança.
Ficamos na zona de segurança por alguns minutos, como previsto e, vendo que as condições se mostravam adequadas e condizentes com nosso conhecimento sobre o local, decidimos tentar surfar a “rabeira” das ondas, isto é, a parte mais afastada do lip e da zona de impacto, consequentemente mais próxima da zona de maior segurança e do canal.
Após diversas tentativas de surfar a parte menos vertical das ondas, umas das ondas da série se deslocou mais do que o normal em direção ao canal onde eu estava posicionado e, apesar da profundidade, ganhou energia suficiente para subir o lip e quebrar na minha direção. No momento que constatei que a onda quebraria sobre mim, tentei remar em direção ao canal, mas não houve tempo suficiente e vi que a onda iria quebrar sobre minha canoa. Imediatamente abandonei a canoa e submergi para furar a onda, o que fiz sem qualquer dificuldade. Apesar de estar usando o leash, a força da ondulação levou a canoa. Eu não sofri qualquer deslocamento.
Assim que emergi, vi que os demais remadores estavam a cerca de 30 metros de mim e já haviam me visto também. Nadei calmamente para o outside, em direção a eles, para que pudessem me auxiliar no procedimento de resgate da canoa. Menos de 10 segundos depois, vi que os pilotos dos jets haviam me visto também e um deles veio imediatamente ao meu encontro e, obviamente, pedi que ele me levasse até a canoa, para facilitar o resgate. Ele me atendeu imediatamente.
Assim que subi no sled rebocado pelo jet, vi que a ama estava separada da canoa, ambas a cerca de 100 metros do local, talvez um pouco menos, mas já fora da zona de impacto, segundo me informou o piloto do jet, altamente experiente, me tranquilizando sobre a situação.
Entrei de volta na água para pegar a canoa e, concomitantemente, outro piloto de jet e sua dupla vieram ao meu encontro para prestar auxílio, já que o primeiro precisou se retirar do local para prestar suporte ao surfista que fazia dupla com ele.
O remador que estava comigo também me prestou auxílio segurando a ama, que estava a poucos metros. Verificamos que os iakos sofreram algumas avarias, mas ainda assim conseguimos remontar a canoa em poucos segundos. Saí do local remando tranquilamente, justamente porque estávamos no canal (zona de segurança), até a Urca. A canoa e a ama sofreram avarias leves, as quais, como disse, sequer impediram que eu voltasse remando até a Urca. Nem eu nem os demais remadores sofremos qualquer lesão e estes permanecerem no local por mais alguns minutos.
Os esclarecimentos acerca dos eventos que, de fato, ocorreram é importante para que outros remadores tenham ciência dos riscos que envolvem a atividade, especialmente em condições climáticas mais extremas, mas serve também para afastar toda e qualquer afirmação especulativa de que teria havido imprudência por mim ou pelos demais remadores que estavam no local.
Obviamente, nos expusemos a riscos que sabíamos estar correndo, mas apenas pelo fato de que nos sentíamos preparados para enfrentá-los, com maior ou menor grau de dificuldade. No caso específico, o apoio dos pilotos de jet facilitou muito, aos quais novamente agradeço, como fiz ainda na água e depois, por mensagem.
Naturalmente, poucos esportistas possuem experiência para remar ou surfar em condições como aquelas que se encontravam no local, experiência essa que estamos adquirindo a cada dia que vamos para água. Mas, não é correto presumir que não a tinha em absoluto e muito menos que agi de forma imprudente, pois, como disse, foram observados diversos procedimentos de segurança, os quais, entretanto, não são infalíveis.
A “vaca” acontece em qualquer modalidade de surfe, do body surf à canoa polinésia, mas é um risco inerente à atividade e ao qual alguns estão dispostos a correr. A lição que fica é que, para surfar de canoa naquele local, além de equipamento e experiência no esporte, o ideal é ter apoio náutico com pessoas experientes para incidentes do tipo.
Espero poder ter esclarecido os eventos realmente ocorridos, para que os editores das referidas publicações possam trazer a seus leitores a correta apuração dos fatos.
Atenciosamente,
Pedro Ivo Mello