
Inscrições abertas para o Festival Itanhaense de Remada
Em sua terceira edição, o Festival Itanhaense de Remada será realizado no mês de abril, oferecendo ... leia mais

Nos últimos anos, testemunhamos um crescimento vertiginoso da va’a no Brasil, um fenômeno que impressionou a muitos. Tive o privilégio de estar em Santos quando a primeira canoa chegou ao país, no início dos anos 2000, desembarcando em nosso porto. Naquela época, minha irmã e minha prima remavam no que era então o único clube da cidade — e um dos dois únicos em todo o Brasil (o outro ficava no Rio de Janeiro). A possibilidade de remar com mais pessoas na mesma embarcação era algo novo e fascinante, uma experiência coletiva que se diferenciava de tudo que conhecíamos em termos de canoagem naqueles tempos. Mas minha rotina diária me permitia apenas remadas esporádicas.
Anos mais tarde, por volta de 2009, o fenômeno do stand up paddle me reconectou à canoa de forma mais profunda. Voltei a remar com regularidade e, inspirado pelo trabalho pioneiro de produção de conteúdo sobre canoagem feito por amigos como Fábio Maradei e Jeferson Sestaro, comecei a cobrir a va’a, dedicando um espaço cada vez maior à canoagem polinésia na revista Fluir Stand Up, da qual fui fundador e editor-chefe ao longo dos seis anos em que a publicação existiu.
Ao longo dessa jornada, seria impossível quantificar os amigos que a canoa me trouxe. Muitos se tornaram parte da minha família, presentes tanto nos momentos de dificuldade quanto nas celebrações. Quase 25 anos se passaram desde a primeira vez que sentei em uma OC6 em Santos. Muita coisa mudou, algumas não tão boas, mas a filosofia da va’a, em muitos casos, permanece e até se aprimorou. Lembro-me de estar em uma praia paradisíaca no Nordeste em 2011, a trabalho, e pensar: “imagina poder remar de canoa aqui”. Hoje, isso é uma realidade. Nos dias atuais, chegamos a lugares como aquele e encontramos uma comunidade, nossa “tribo”, pessoas locais que compartilham da mesma paixão e que só conhecemos graças à canoa.

Saltando para o presente, em 2025, a função do jornalismo continua sendo a de garantir o acesso à informação, dar voz à comunidade e promover a reflexão. Notei um aumento no número de pessoas que me procuraram este ano, preocupadas com os rumos que a va’a tem tomado no Brasil. Relatos sobre disputas, falta de camaradagem e egos inflados, entre outros assuntos ruins, tornaram-se mais frequentes. Tudo isso, infelizmente, é uma realidade. Podemos ignorá-la ou podemos encará-la de frente para debater essa situação.
De fato, há quem enxergue na canoa apenas uma oportunidade comercial, sem o devido cuidado com seus fundamentos e sua profunda carga cultural. Há também quem utilize a vasta gama de categorias, muitas delas sem grande competitividade, para atribuir um peso desproporcional às suas conquistas. Casos de sabotagem e ofensas em grupos de whatsapp existem. Mas seria justo medir a va’a no Brasil apenas por essa régua?

Neste último domingo, o clube Tribuzana Va’a, de Florianópolis, celebrou seu sétimo aniversário. A história deles começou quando um casal de amigos de longa data, André e Valéria, decidiu comprar uma canoa e fundar um clube para remar com pessoas queridas. A pretensão não ia muito além disso. O tempo passou, o número de pessoas querendo remar junto não parou de aumentar e eles decidiram deixar seus trabalhos formais para se dedicar ao clube. Na celebração de ontem havia cerca de 80 pessoas na base. Vi discursos, emoção, abraços, memórias e uma energia genuína sendo compartilhada.
Tenho a certeza de que, assim como a do Tribuzana, existem muitas histórias semelhantes Brasil afora. Histórias de pessoas que tiveram suas vidas transformadas não pela busca de dinheiro ou para massagear o ego com uma medalha, mas porque ouviram o chamado da canoa e o atenderam de coração aberto. Remar em uma canoa polinésia é uma experiência poderosa; títulos e medalhas são efêmeros. Como meu sensei de judô costumava dizer, “o verdadeiro valor do esporte está em formar cidadãos melhores”.
Que neste fim de ano, mais e mais pessoas se permitam embarcar nessa canoa.
Aloha mai kākou!