Será essa criança de 9 anos o próximo fenômeno de Maui?
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Cedo ou tarde todos nós enfrentamos dificuldades em nossa vida. No caso do recém-coroado bicampeão mundial, Luiz Diniz, elas começaram bem cedo.
Nascido na comunidade de Santa Rosa, em Guarujá, litoral de SP, Diniz foi criado desde os cinco meses de vida por seus avós, José e Maria Diniz, que apesar das limitações financeiras, o criaram com muito amor e afeto.
Diniz teve uma típica infância de garoto de periferia: pés descalços jogando bola e empinando pipa o dia inteiro. “Cresci fazendo coisas de crianças da minha idade. Naquela época não pensava em muita coisa”, conta.
O apelido de “Bolinha” vem dessa época. É que o netinho de dona Maria e seu José sempre foi “bom de garfo” e uns quilinhos a mais acabaram sendo inevitáveis. “Eu era bem gordinho antes de surfar”, releva de forma bem humorada.
A vida de Luiz Diniz mudou totalmente de rumo aos 14 anos, quando teve acesso ao surfe pela primeira vez através da ONG CT Lugar ao Sol, no Guarujá (SP), que usa o surfe como ferramenta para tirar jovens da ociosidade e mostrar caminhos para uma vida digna.
“Uma das primeiras coisas que o Ademir me estipulou foi ‘emagrecer’ logo que comecei a aprender a surfar”, relata Diniz sobre as primeiras orientações que recebeu de Ademir Silva, um dos fundadores da CT Lugar ao Sol.
Quando perguntado sobre o papel que a ONG teve em sua vida ele é direto: “Não sei o que seria de mim se eu não tivesse conhecido e entrado neste projeto. Fez a diferença pra mim e continua fazendo para outras crianças carentes da cidade do Guarujá. Porque além de ensinarem o surfe eles formam o cidadão e nos deixam preparados para a vida, mostrando o caminho certo.”.
O talento natural nas ondas logo foi observado por outra pessoa ligada à ONG, Carmelo Seabra, que no futuro se tornaria um de seus maiores incentivadores e um segundo pai.
Diniz, por ter começado relativamente tarde no surfe, demorou um pouco a deslanchar nas competições locais e sentia que estava sempre a um passo atrás de seus adversários. Mas a determinação que o faria conquistar dois títulos mundiais no futuro já estava presente e ele seguiu lutando até finalmente ganhar seu primeiro campeonato. Um Guarujaense de Surfe organizado pelo ‘Local Hero’ Kias de Souza. A partir daí, Luiz Diniz passou a figurar em praticamente todos os pódios de sua categoria nos campeonatos realizados pelo Guarujá e região.
Passaram-se alguns anos até que o SUP Wave se tornou popular no litoral brasileiro e vendo que Carmelo Seabra se divertia muito surfando com remos, resolveu experimentar – e ficou fissurado.
Carmelo, por sua vez, ficou surpreso com a desenvoltura de Diniz com o SUP e então passou a incentivá-lo a praticar o esporte. Sempre que caiam juntos, oferecia sua prancha e seu remo para Diniz até que resolveu vender sua prancha por um preço simbólico ao “pupilo”.
Diniz, porém, seguiu surfando de pranchinha e de SUP, sempre intercalando os equipamentos entre uma queda e outra. A evolução, em ambas as modalidades, seguiu seu curso e em 2015 ele deixou todos espantados ao conquistar, na mesma competição, o Guarujaense de Surfe, a primeira colocação na categoria Open, no surfe de pranchinha, e a terceira colocação no SUP Wave.
Incentivado por seu patrocinador de pranchas e por Carmelo Seabra, resolveu investir no Brasileiro de SUP Wave, e em seu ano de estreia, 2016, sagrou-se vice-campeão brasileiro.
A essa altura todos no Brasil já sabiam quem era aquele carinha do Guarujá que dava aéreo reverse com o SUP de um jeito tão natural que chegava a parecer fácil de fazer.
Faltava agora fazer com que o mundo soubesse quem ele era.
A oportunidade veio com a convocação para o Mundial de SUP e Paddleboard da ISA em 2017 que seria realizado na Dinamarca. Mas contando apenas com apoiadores e sem um patrocinador principal, como viabilizar uma viagem cara dessas?
Com a determinação de quem está acostumado a driblar dificuldades desde a infância ele foi à luta, e contando com ajuda de amigos, familiares e empresários, conseguiu levantar a verba necessária para disputar o Mundial.
O “Bolinha” de Santa Rosa chegou à Dinamarca como um ilustre desconhecido, mas saiu de lá como um rei ostentando uma medalha de ouro no peito. Enquanto seus adversários se atolavam em ondas ruins, Diniz literalmente voava deixando atônitos seus adversários e locutores. “Who is that guy??”, perguntavam.
De volta ao Brasil, foi recebido calorosamente por seus amigos que o buscaram no aeroporto e o levaram até a sua Santa Rosa, onde foi acolhido com festa.
O título mundial trouxe novos apoiadores e algumas portas se abriram, mas a luta continuou.
Em 2018 Diniz conseguiu novamente uma vaga para representar o Brasil no Mundial da China, do outro lado do mundo, e novamente lá foi ele, de Santa Rosa para o mundo, representar o Brasil em terras estrangeiras.
As ondas dessa vez estavam ótimas. Esquerdas perfeitas e com sessões tubulares, ideais para que Luiz Diniz exibisse a qualidade de seu surfe em um palco apropriado.
E se havia alguma desconfiança quanto à qualidade de seu surfe, “Na Dinamarca pode ter sido sorte de principiante”, bem, passadas as primeiras baterias, ela foi totalmente dissipada.
Diniz venceu quase todas as baterias (somente na semifinal ele ficou em segundo) até conquistar o ouro e o bicampeonato mundial de forma avassaladora.
A conquista também trouxe outro prêmio importante: o guarujaense fará parte da primeira seleção brasileira de SUP a disputar os Jogos Pan-Americanos, que irão rolar em Lima, em 2019, que pela primeira vez na história contemplará disputas de stand up paddle.
Em um momento em que o SUP Wave se mantém estagnado no Brasil, tanto em termos de mercado, quanto de oferta de competições, é quase um paradoxo termos em nossas águas atletas do quilate de Luiz Diniz.
Isso mais parece um recado dos deuses do surfe nos mostrando que mesmo com todas as dificuldades que enfrentamos, devemos acreditar e seguir em frente, mas sem perder a humildade e o valor da amizade. Essa talvez seja a lição mais valorosa que Luiz Diniz tenha a nos ensinar.