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Zé Peixe só poderia ter nascido no Brasil. Afinal, com uma costa tão grande, tantos rios e lagos, nosso país é, na verdade, o “país dos esportes aquáticos”.
Sendo assim, não por acaso, temos uma lista extensa de waterman/woman brazucas. De Carlos Burle a Amyr Klink, passando por Andrea Moller, Igor de Souza, e por aí vai. Enfim, se você pesquisar um pouco, verá que muitos brasileiros fazem jus ao título.
Contudo, causa surpresa o fato de que relativamente pouca gente saiba quem foi José Martins Ribeiro Nunes, mais conhecido como Zé Peixe, falecido em 2012, aos 85 anos.
Sua vida foi dedicada quase integralmente ao mar. O apelido “peixe” não poderia ser mais adequado àquele homem franzino de 1,60m, de poucas palavras, mas sempre muito educado no trato com as pessoas.
Filho de Vectúria Martins e Nicanor Ribeiro Nunes, Zé Peixe nasceu em 5 de janeiro de 1927, na capital sergipana, Aracaju, e passou grande parte de sua infância dentro do rio Sergipe. A ligação com a água foi sempre tão intensa que ele não sabia ao certo quando aprendeu a nadar. “Desde muito garoto”, dizia.
Zé acompanhou a construção do cais do porto de sua cidade e por conta de sua agilidade e seu conhecimento do mar, passou a executar pequenos serviços para a para a Capitania dos Portos.
Aos 11 anos ganhou o apelido que o tonaria famoso entre seus pares pelo comandante da Marinha, Aldo Sá Brito de Souza, uma vez que o garoto passava mais tempo na água do que em terra.
Com o tempo, sua conexão com as águas foi se tornando cada vez mais respeitada e ele passou a auxiliar os práticos durante o serviço, ajudando-os a conduzir as embarcações de grande porte pelo rio, cujos caminhos mais seguros conhecia como ninguém.
No entanto, mesmo com todo seu conhecimento na praticagem, ele só seria admitido oficialmente na profissão em 1947, após passar no concurso realizado pela Capitania dos Portos de Sergipe.
E foi nos anos em que passou exercendo a atividade de prático que seus feitos o alçaram ao patamar das “lendas vivas”.
Para começar, após conduzir as embarcações com segurança para as águas profundas do mar do Sergipe, ele dispensava os barcos da praticagem e retornava nadando para terra firme. Mas se havia outro navio para chegar, ele preferia ficar na água ao invés de aguardar no porto. Era comum ficar até dez horas em uma boia em mar aberto esperando uma embarcação chegar.
Essa rotina foi uma constante em sua vida e mesmo aposentado, e já com a idade avançada, Zé Peixe seguiu exercendo o ofício de prático, em regime de turnos de três vezes por semana, mas atuando da mesma maneira: pulando de uma altura média de 17 metros, da torre do navio à água, para, em seguida, nadar por quilômetros e quilômetros até a praia.
Em certa ocasião, em meio a um mar revolto, o “homem peixe” heroicamente se lançou ao mar para resgatar dois tripulantes que haviam caído de uma embarcação que quase virou ao ser atingida por uma onda. Esse ato de bravura lhe rendeu uma menção honrosa da Marinha.
Sua desenvoltura com o oceano só não chamou mais a atenção do que seus hábitos excêntricos: ele não tomava banho e nem bebia água doce, se alimentava basicamente de frutas, pão e café e raramente usava sapatos.
A falta de banho de água doce, no entanto, jamais pode ser confundida com desleixo. Apesar de só tomar banho de mar, ele fazia a barba em casa normalmente. Na verdade, este apuramento de barba feita e de cabelo cortado faziam parte de seu ritual diário.
Avesso aos holofotes, ele raramente concedia entrevistas e, quando aceitava, respondia às perguntas com poucas palavras, para o desespero dos jornalistas. É que Zé Peixe não se via como uma pessoa especial ou diferente das outras, dai a estranheza quando lhe pediam uma entrevista.
Até o fim de sua vida manteve uma rotina diária bem simples. Quando não estava embarcado, acordava muito cedo e, por volta das 6h, já estava tomando seu banho no rio, cuidava dos seus três barcos que ficavam atracados em frente à capitania dos portos e ia de bicicleta ao mercado comprar frutas.
Também ia à missa quando não estava em serviço – sempre na Igreja do São José ou na do padre Carvalho no Colégio Arquidiocesano. Zé Peixe não fumava, nunca bebeu álcool, dormia às 20h. Era calado e desconfiado, mas ao falar do mar sempre abria um largo sorriso.
Em 2015 o lendário waterman sergipano recebeu o devido reconhecimento de sua cidade com a inauguração do Espaço Zé Peixe, em Aracaju.
Localizado no antigo Terminal Hidroviário, agora revitalizado, o espaço espaço possui dois pavimentos, um superior e um inferior. No inferior, há uma loja de artesanato sergipano, Café do Zé, um Ponto Banese, loja de doces caseiros da terra.
Na parte superior, um espaço reservado para o Memorial Zé Peixe e sua trajetória de vida, exposição de painéis do artista plástico Elias Santos e uma estátua em bronze do homenageado localizada em um espaço de contemplação ao rio Sergipe.